A CRUZ DE CRISTO - Resenha

 

A CRUZ DE CRISTO

Resenha

 

 

Esta obra literária de John Stott  foi escrita originalmente em inglês e traduzida para a língua portuguesa por João Batista, já esta em sua 12a impressão e é na minha opinião um verdadeiro tratado acerca da Cruz, algoz de nosso Senhor e Salvador Jesus, sua necessidade, sua representação eterna e sua compreensão como justiça e salvação humana.

 

É admirável como o escritor constrói as idéias com palavras escolhidas que possibilitam uma visão clara daquilo que ele tinha em mente, a sua capacidade de transmitir suas convicções bem ajustadas às da escritura sagrada de maneira harmoniosa, prolixa e com a precisão de um destro cirurgião.

A intimidade com a bíblia em particular e com várias obras e autores renomados que amantes do mesmo tema como Roger Bechwith Michael Green Dr. Leon Morris entre outros capacita Stott a escrever tão convincente obra literária.

 

Acredito piamente na necessidade de tais elucidações pela polêmica que envolve a Cruz, pois como instrumento de tortura da mais violenta, sangrenta sem falar de todo os procedimentos que a antecedem fazem dela algo a ser esquecido, não mencionado para não chocar a hodierna “população civilizada” e muito mais pela necessidade, como diz o autor, de demonstrar o que a cruz representa para a raça humana condenada a extinção e extermínio total. Mesmo os praticantes do Cristianismo, na sua maioria não sabe que sentimento envolve a Cruz de Cristo, se repúdio e aversão pela sua crueldade, ou se paixão pela sua obra redentora, se é maldita ou se é bendita, odiada por maltratar o Mestre amado ou amada por ser objeto de salvação.

 

Stott demonstra nesta obra que a contradição é uma marca registrada de Deus em todos os tempos pois “nossos pensamentos não são os seus” , a nossa natural compreensão das coisas não coincide com a maneira de Deus em vários aspectos, aquilo que para nós é desprezível, para Deus tem valor, nosso conceito acerca do certo ou errado é mera nuança em relação aos valores divinos, nossa consciência de pecado é muito tênue se comparado a real profundidade e implicações que o pecado traz o que  leva alguns superficiais a questionarem sobre a necessidade de uma morte tão horrível e cruenta, se não poderia se de outra maneira mais amena a salvação da humanidade. É deveras brilhante como Stott apresenta o pecado como a intenção intima de substituir-mos o senhorio do Criador pelo nosso próprio governo, ou seja, ter autonomia, ser independente, nos livrar-mos da paternidade divina, recusar sua justiça para estabelecer nossa própria justiça (que são trapos de imundícies).

 

Só a substituição pode trazer satisfação á santidade de Deus que não pode ser conivente com o pecado, só a substituição pôde fazer o que nada mais poderia, buscar a justiça imprescindível para favor do homem em Jesus Cristo o Deus que tomou forma e condições humanas, a humanidade não tem condição de pleitear algo diante de Deus, pois seus valores não são condizentes nenhum favor poderia alcançar pois não tem créditos para isto, o pecado o separou de Deus embora nada nos separa do amor Deus em relação a nós, ficamos ilhados, sem contato com o Criador pois nossos pecados fez separação entre nós e o Todo-Poderoso, Jeremias com muita razão afirma que o Senhor age por amor ao seu próprio nome(Jr 14:7), se em nós não há créditos, não há méritos, então apelamos para o seu próprio nome que tem todo o crédito e mérito. De outra maneira não poderia Deus manifestar sua bondade e seu amor, como bem afirma  John Stott, Deus não age ora em conformidade com seu amor e ora em conformidade com sua santidade, mas, sempre age devidamente em coerência com sua totalidade de caráter, pois não tem nem seque sombra de variação.

 

A substituição da humanidade pelo Filho de Deus em forma humana (filho do homem) é de uma eficácia suprema, pois atenderia tanto a necessidade de amor de Deus como de justiça, e esta substituição já estava vaticinada em toda a história da humanidade desde Adão mostrando que nele esta não só a vida mas também sua sustentação. Interessante a cronologia dos fatos lembrado pelo autor de que a reconciliação com o Criador se fez mais necessária que a adoração á Ele. A mensagem expressa em toda a liturgia velho-testamentaria era clara, aceita e compreendida por todos os judeus, a penalidade pelo pecado era a morte, estava na justiça inflexível e eterna de Deus, Ele não pode fazer vista grossas ao pecado seria aceitação, teria que ser dissipado, punido com severidade grandiosa como sua própria santidade e sem derramamento de sangue não há remissão de pecado.

 

A exegese de Hebreus 9.15:17 tem sido alvo de controvérsias desde a Patrística e tema de várias apologias heréticas (unicistas – modalistas) onde baseado no fato de que Deus não morre, logo, se Jesus morreu na cruz este não era Deus, pois um dos atributos de Deus é imortalidade e como Todo-Poderoso não poderia nem sequer sofrer (Patripassianismo) , como se justificaria a celebre frase de Carlos Weley que diz: “Espantoso amor! Como pode ser que tu, meu Deus, morresse por mim?” Stott explica que apesar de textos como Atos 20:28 onde dá entender que Deus comprou a igreja com seu próprio sangue, não existe nenhum texto que afirma inequivocamente que “Deus morreu”, Tertuliano teve um grande litígio com Praxeas, famoso monofisita, acerca da morte de Deus, o Pai, nesta obra o autor nos esclarece que a obra da redenção não foi  feita isoladamente pelo Pai, nem isoladamente pelo Filho, (lembrando que quando se lê Deus no novo testamento, quase sempre se refere ao Pai, salvo em textos que contenham informações específicas), mas foi obra conjunta da trindade, o Pai enviando, o Filho sendo enviado, e o Espírito Santo providenciando o nascimento e toda a assistência necessária ao longo da vida do Filho que se encontrava em condição humana.

 

As dissertações de Jonh Stott me faz lembrar o hino de Almeida Sobrinho que consta na harpa Cristã número 18 que traz como título “Grata nova”, onde diz:

                                        “Luz divina resplandece

                                          mostra ao triste pecador

                                          que na cruz estão unidos

                                          a Justiça e o Amor.”

 

É surpreendente  a maneira que ele leva o leitor atento a visualizar o surgir de uma nova era, novo dia quando Cristo morreu e ressuscitou  dentre os mortos, na plenitude dos tempos, descrito em Gálatas 4:4 surge um novo dia chamado por Paulo em II Coríntios 6:12 como “dia de salvação”, na verdade o livro não traz algo novo, mas nos leva a mergulhar muito mais profundo num assunto tantas vezes falado de maneira superficial, leva-nos a uma compreensão mais aperfeiçoada daquilo que consiste a Cruz de Cristo, numa visão de formada da leitura da cruz como propiciação, se não tiver conceito cristão pode conceber a idéia de  que os sacrifícios eram formas de suborno aceito por Deus, ou como no paganismo, um engodo oferecido para apaziguar a ira de um deus iracundo, oferecendo tributos como pagamento ou trocas pelos bens alcançados, Stott nos leva a compreender como a doutrina da substituição em nada tem haver com o paganismo, mas com Justiça e Amor divino.

 

Neste livro se percebe claramente que a Cruz de Cristo “fala” numa linguagem sem palavras (cordeiro mudo que tira o pecado do mundo) sua mensagem é contundente, inconfundível, nos revela a natureza divina para que não fiquemos fazendo conjecturas sem fundamentos sobre sua personalidade, Ele se revela á nós, podemos no decorrer deste livro perceber alguns absurdos que permeia o povo Cristão em por exemplo afirmar que “houve festa no inferno” quando Jesus morreu na Cruz, pois o Diabo se sentiu vencedor matando aquele que traria salvação, nem de longe a Cruz deixa margem para tal afirmação que só serve para animar auditório, a mensagem da Cruz é clara e fala de  revelação divina e salvação á todos os homens que buscarem justificação em tal ato expiatório coisa que amplamente foi divulgado em toda a Escritura Sagrada, era a glorificação de Deus, segundo o Evangelho de João, era a derrota de satanás que queria vê-lo desobedecer o Pai, revidar como os demais homens, blasfemar como a situação oferecia oportunidade, ou fugir ao propósito que lhe foi confiado, mas em nada pecou, tudo suportou, ninguém o matou mas Ele deu a si mesmo como sacrifício pela humanidade, não houve vitória ou aparente vitória de satanás, mas ele viu a completa vitória de Cristo sobre todas as fraquezas humanas a que foi submetido. Poderia até alguém querer morrer por alguém inocente, o que seria de extraordinária filantropia e bondade, mas morrer por alguém mau, cruel, ingrato, sem afeto, sem nenhum valor, é algo divino.

 

Percebe-se num análise atento do livro que Stott tem formação Calvinista, e que também (se consciente ou não, não sei) ele evita falar na Pessoa do Espírito Santo, não sei se não faz parte do assunto tratado ou se o autor crê que o Espírito Santo não participou da redenção da Cruz de Cristo.

 

Stott é enfático em afirmar que a mensagem da Cruz não seria completa se não falasse de sofrimento, castigo, vergonha, morte e necessariamente, ressurreição. Como diz o evangelho “ se Cristo não ressuscitou é vã a nossa esperança”, o fato de que Ele ressuscitou é que nos garante vitória, garante nossa igual ressurreição, Ele teria (como fez) de ressuscitar seu próprio corpo mortal no qual viveu para que fosse a primícias da ressurreição, exemplo escrito e lido daquilo que haverá de acontecer conosco que temos tal esperança, assim como seu sofrimento e morte foi em nosso lugar, da mesma maneira somos participantes de sua vitória, o apóstolo João nos afirma que vencemos o maligno, mas quando é que travamos batalha com ele e o derrotamos? Quando Cristo o venceu na Cruz, esta vitória foi extensiva á todos os que crêem.

 

Se a vitória de Cristo, continua Stott em seu décimo capítulo, é extensiva a todos os que crêem, o vitupério também deve ser, a vergonha da cruz foi marcante em sua paixão, e os que fazem menção do nome do Senhor deve também carregar as marcas que ela traz, o que quer dizer Stott é que o sacrifício da Cruz de Cristo deve Ter continuidade em nossas vidas causadas pela  conservação e observação da santificação promovida por ela, pela constante luta causada por conhecer a vontade daquele que se entregou a morte e morte de Cruz em nosso lugar, negar a si mesmo é o que gera uma luta constante dentro de cada um denominado por Jesus, “Levar cada um a sua Cruz”, a pratica do verdadeiro Cristianismo é o trazer as marcas de Cristo. Como no exemplo de Cristo, o sofrimento redunda em glorificação, assim também é com todo o que nele crê, seja glorificado após o período de sofrimento que a cruz acarreta. Cristo gloriou-se  na cruz, nós também nos gloriamos encarando-a como caminho de aceitação com Deus, única maneira gerada pelo próprio Deus para nos dar acesso á sua santíssima pessoa, nos gloriamos nela pela compreensão que ela é o padrão de nossa negação própria, como diz Paulo, “ o mundo esta crucificado para  mim, e eu para o mundo”.

 

Em suma, a Cruz ainda continua a ser escândalo para os homens, ignorância para alguns, desprezo para outros, hipocrisia para outros e reafirmação e renovo de fé e esperança para outros.

 

 

Por Osni de figueiredo.

São Paulo, 26 de janeiro de 2008